QUINTA
CIENTÍFICA

DIA 06 Julho

Comentário: Advogando por envolvimento e engajamento de pacientes e público em avaliações econômicas em saúde

Comentário: Advogando por envolvimento e engajamento de pacientes e público em avaliações econômicas em saúde

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Este texto é baseado na resenha do seguinte artigo: Staniszewska, S., Jakab, I., Low, E. et al. Commentary: Advocating for patient and public involvement and engagement in health economic evaluation. Res Involv Engagem 9, 45 (2023). https://doi.org/10.1186/s40900-023-00444-3

Introdução ao tema – nota de Tina Guimarães

O ISPOR, a Sociedade Profissional para Economia da Saúde e Pesquisa de Resultados, é uma organização composta de muitos atores, e membros de mais de 110 países. Ela foi criada em 1995 com a proposta de servir como catalisador da ciência e prática na área de economia da saúde e pesquisa de resultados (outcomes research). Entre as várias atividades da organização está a elaboração de guias para pesquisadores e interessados no tema de avaliações econômicas.

Em 2013 um grupo de trabalho da instituição elaborou um guia voltado a pesquisadores e avaliadores de periódicos científicos, chamado Consolidated Health Economic Evaluation Reporting Standards (CHEERS). A proposta desse documento era servir como um guia para pesquisadores e avaliadores de artigos em periódicos para servir como um conjunto de diretrizes desenvolvido para melhorar a qualidade e a transparência dos relatórios de avaliação econômica em saúde. Ele fornece um conjunto de itens essenciais que devem ser incluídos em estudos de avaliação econômica para garantir a clareza, consistência e comparabilidade dos resultados.

Em 2022 esse item foi atualizado para fazer frente aos avanços na área de avaliação econômica e endereçar limitações no relatório de 2013, entre outras razões que podem ser acessadas aqui

A resenha do artigo de hoje tem como objetivo apresentar comentários de alguns autores, entre eles Michael Drummond, uma referência na área de economia da saúde, sobre a necessidade de um advocacy para engajamento de pacientes e público nas avaliações econômicas, além de mostrar como eles foram incluídos na atualização do CHEERS em 2022. 

Vamos à resenha!

Contextualização

As avaliações econômicas em saúde são análises comparativas de diferentes cursos de ação em termos de seus custos e consequências. Essas avaliações estão se tornando cada vez mais influentes nas decisões sobre o uso de intervenções em saúde. Por exemplo, o Instituto Nacional de Excelência em Saúde e Cuidados (NICE), na Inglaterra, utiliza critérios clínicos e de custo-efetividade na formulação de suas recomendações. Arranjos semelhantes existem em muitos outros países, nos quais são considerados tanto a efetividade clínica quanto o custo nas decisões sobre a prestação de cuidados. Portanto, é possível que um novo tratamento, embora clinicamente efetivo, não seja recomendado ou tenha seu uso restrito devido ao seu custo. Isso pode afetar o acesso dos pacientes aos tratamentos, por isso é essencial que os pacientes e o público possam entender e se envolver na forma como tais decisões são tomadas, mesmo do ponto de vista moral. No futuro, os pacientes e o público devem ser envolvidos no aprimoramento ou desenvolvimento dos conceitos, métodos e abordagens mais amplos utilizados na avaliação econômica em saúde.

O guia Consolidated Health Economic Evaluation Reporting Standards (CHEERS) foi desenvolvido e publicada em 2013 para garantir que as avaliações econômicas em saúde sejam realizadas de forma consistente. Esse documento foi elaborado para ajudar os autores de estudos de ATS a documentarem com precisão quais intervenções em saúde estavam sendo comparadas e em qual contexto, como a avaliação foi realizada, quais foram os resultados e outros detalhes que possam ajudar os leitores a compreender e utilizar uma avaliação. Desde a publicação do CHEERS, o envolvimento e engajamento de pacientes e do público (Patient and Public Involvement and Engagement – PPIE, sigla em inglês) cresceu internacionalmente em pesquisas de saúde e assistência social, embora ainda seja relativamente raro na economia da saúde, com algumas exceções, como o desenvolvimento de estruturas para PPIE em modelagem matemática e econômica. De toda forma, a economia como disciplina não evoluiu com a participação integral de pacientes e do público no desenvolvimento de seus conceitos e métodos, ao mesmo nível de outras áreas de pesquisa em saúde e assistência social.

Mais recentemente, observa-se sinais de formas mais ativas de colaboração dos pacientes na condução de avaliações econômicas, mas ainda há um longo caminho a percorrer. Espera-se que o guia CHEERS apoie formas mais ativas de colaboração, em vez de apenas incluir os pacientes como fontes de dados.

Ao planejar a atualização do CHEERS, o Grupo de Trabalho da ISPOR (The Professional Society for Health Economics and Outcomes Research) reconheceu que o crescente papel dos pacientes e do público na pesquisa precisava estar refletido na comunicação de avaliações econômicas em saúde e, por consequência, na condução dessas avaliações. Este comentário relata o envolvimento público no desenvolvimento do CHEERS 2022, com foco especial no estabelecimento do Grupo de Referência Internacional PPIE, que identificou a necessidade de desenvolver orientações para representantes de pacientes e organizações de pacientes, bem como um glossário de termos para que eles possam se envolver mais na avaliação econômica em saúde. 

Engajamento de pacientes e público

O envolvimento na avaliação econômica em saúde precisa reconhecer que a contribuição pode ser diferente de um paciente (em termos gerais), de um colaborador público ou de um paciente com experiência naquela condição. Neste artigo, os autores usam o termo colaborador público para descrever indivíduos que estiveram envolvidos no desenvolvimento do CHEERS e que possuíam uma perspectiva pública mais ampla. Eles não estavam envolvidos principalmente por causa de sua experiência de vida, mas, em outros contextos, os colaboradores públicos podem se basear em uma experiência pessoal mais ampla, seja a própria ou a de outras pessoas que conhecem ou representam.

Estabelecimento do Grupo de Referência Internacional PPIE

Foi criado um Grupo de Referência Pública Internacional para orientar o envolvimento público no desenvolvimento do CHEERS 2022, com a intenção de incorporar participação de pacientes e público em estágios-chave da atualização do checklist do CHEERS. O Grupo de Referência Pública incluiu indivíduos interessados na divulgação de avaliações econômicas em saúde, que possuem conhecimento em pesquisa e avaliação de tecnologias em saúde e que estiveram envolvidos em uma variedade de estudos e iniciativas. Buscou-se selecionar indivíduos que representariam visão geral da população, em vez de uma área específica de experiência do paciente, pois entende-se que a discussão sobre os itens do CHEERS aconteceria em um nível macro, em vez de focar em áreas específicas da experiência ou vivência do paciente.

Envolvimento público no processo de atualização do CHEERS 2022

O checklist do CHEERS foi atualizado por meio de várias rodadas de pesquisas com o objetivo de alcançar consenso (foi usado o Método Delphi ou Painel Delphi[1] modificado), no qual especialistas em avaliação econômica, bem como aqueles com perspectivas em edição de periódicos, tomada de decisão, avaliação de tecnologias em saúde e setor privado da área de ciências da vida foram convidados a participar. Além de serem convidados para o Painel Delphi, o Grupo de Referência Pública pôde fornecer contribuições por meio de várias reuniões em momentos estratégicos do processo.

Foi organizada uma série de reuniões ou “espaços de conhecimento” virtualmente, utilizando o programa Microsoft Teams, que oferece facilidade para reuniões online, para criar oportunidades de diálogo deliberativo sobre o CHEERS. Essas reuniões incluíram membros do Grupo de Trabalho da ISPOR apresentando sobre o contexto e desenvolvimento do CHEERS. 

  • Primeira reunião: foram revisados os itens do CHEERS com os colaboradores públicos fazendo comentários sobre a redação e o significado dos itens. Cada item do checklist do CHEERS foi considerado separadamente. O Grupo de Trabalho da ISPOR editou os itens, redigiu novos itens e os circulou para o Grupo de Referência Pública. 
  • Segunda reunião: discussão dos itens editados, garantindo que o PPIE fosse incorporado desde cedo no processo. 
  • Terceira reunião: o foco foi revisar o progresso, desenvolver ideias para recursos que apoiassem pacientes e o público na divulgação do CHEERS, o que subsidiou o guia incluído como um apêndice. 

Uma primeira versão do documento que apoia o PPIE na avaliação econômica em saúde e a versão final do checklist foram enviados ao Grupo de Referência Pública para comentários e contribuições. Cada item foi então revisado pelo Grupo de Referência Pública e discutido para esclarecer o significado do ponto de vista público. O Grupo de Referência Pública identificou a necessidade de itens adicionais (áreas de relato de experiência) para capturar qualquer envolvimento de pacientes e público em uma avaliação econômica em saúde. Após discussão com o Grupo de Referência Pública e com outros colaboradores, e seguindo um processo de edição e refinamento, dois itens importantes foram incluídos na lista de verificação. Esses itens são os Itens 21 e 25 do checklist do CHEERS 2022. Para relatar o PPIE na atualização do checklist do CHEERS, um checklist de Orientações para Relato do Envolvimento de Pacientes e do Público – Versão 2 (Guidance for Reporting Involvement of Patients and the Public_Version 2 – GRIPP2) foi publicada juntamente com a atualização do CHEERS 2022.


Itens 21 e 25 do checklist do CHEERS 2022 

21Abordagem para o envolvimento de pacientes e outros afetados pelo estudo:Descreva quaisquer abordagens para envolver pacientes ou usuários do serviço, o público em geral, comunidades ou partes interessadas (como clínicos ou pagadores) no planejamento do estudo.

25Efeito do engajamento com pacientes e outros afetados pelo estudo: Relate qualquer diferença que o envolvimento de pacientes, usuários do serviço, público em geral, comunidade ou partes interessadas tenha causado na abordagem ou resultados do estudo.

Criando um guia para representantes de pacientes e associações de pacientes

Além das discussões sobre os itens, o Grupo de Referência Pública também discutiu a necessidade de criar recursos que apoiem pacientes e colaboradores públicos a se envolverem em discussões sobre avaliação econômica em saúde. Em resposta a isso, foi desenvolvido um guia para apoiar o engajamento de pacientes e do público na avaliação econômica em saúde, no qual o Grupo de Referência Pública fez comentários, resultando em refinamentos adicionais. Por exemplo, eles sugeriram que fossem incluídos todos os itens em vez de apenas uma seleção de itens indicativos, que era a intenção original, para fornecer um ponto de partida no mundo da avaliação econômica em saúde.

Uma segunda camada de revisão

O guia passou por mais uma rodada de revisão por pares com seis colaboradores públicos que não haviam participado do processo até então e um presidente de um Grupo de Referência Pública internacional familiarizado com ATS (Avaliação de Tecnologias em Saúde). Apesar dos esforços anteriores, foi destacado que a linguagem e os conceitos usados nos documentos eram complexos e que seria melhor direcionar o Guia para representantes de pacientes e associações que já possuam algum conhecimento ou já contribuam para avaliações econômicas em saúde. Essas pessoas seriam pontos focais capazes de apoiar seus membros a desenvolver o conhecimento necessário para contribuir. Foi enviado um glossário de termos para auxiliar no desenvolvimento do entendimento. Entende-se que é necessária uma camada adicional de tradução e adaptação para criar um recurso verdadeiramente amigável para aqueles que não estejam familiarizados com a avaliação econômica em saúde, e espera-se alcançar isso no futuro. 

Um chamado para um maior envolvimento integrado de pacientes e do público na avaliação econômica em saúde

O esforço para criar um guia para associações de pacientes e representantes de pacientes reflete a perspectiva de que o envolvimento de pacientes e do público precisa se tornar uma parte rotineira da avaliação econômica em saúde. O envolvimento de pacientes e do público se tornou uma atividade incorporada à pesquisa em saúde e assistência social e é comum internacionalmente na avaliação de tecnologias em saúde. O mesmo progresso não foi observado na avaliação econômica em saúde. Espera-se que a publicação do CHEERS 2022 introduza um incentivo nas formas ativas de colaboração entre pacientes e a economia da saúde. Isso não será representado apenas pelos pacientes como sujeitos em estudos fornecendo dados, por exemplo, indicando suas preferências. Será representado por formas ativas de envolvimento e parceria, com avaliações econômicas em saúde sendo realizadas “com” ou “por” membros da sociedade, em vez de “para” ou “sobre” eles. Além do conteúdo das avaliações, é importante que o campo da economia da saúde considere como os pacientes e os colaboradores públicos são envolvidos no futuro desenvolvimento de conceitos e métodos, para refletir de maneira mais adequada a realidade das vidas dos pacientes nas formas como a avaliação econômica em saúde é conduzida. Esse envolvimento público em aspectos conceituais e metodológicos da avaliação econômica em saúde pode representar uma nova era de colaboração, colocando os pacientes como parceiros no centro da avaliação econômica em saúde.

Discussão e conclusão

O CHEERS 2022 é o primeiro guia para avaliação em saúde que incluiu dois itens sobre envolvimento e engajamento de pacientes e do público. Isso representa apenas um ponto de partida e, assim como todas as orientações, evoluirá ao longo do tempo à medida que a base de evidências que apoia o envolvimento de pacientes e do público na avaliação econômica em saúde se desenvolve e se fortalece. Também representa um estímulo para a comunidade de avaliação econômica em saúde considerar o potencial de formas mais integradas de envolvimento.

O objetivo ao criar o guia para associações de pacientes é incentivar mais diálogo sobre a avaliação econômica em saúde e mais discussões sobre os conceitos, métodos e pressupostos que são importantes nessa deliberação. Pacientes e o público podem fazer contribuições importantes para o pensamento econômico em saúde e espera-se que o CHEERS 2022 seja o início de um esforço maior que veja o envolvimento público como a norma, não a exceção, no futuro da avaliação econômica em saúde.

Por que indicamos esse artigo:

  • Trata de um guia (chamado CHEERS) recém-publicado da ISPOR, um manual desenvolvido para melhorar a qualidade e transparência dos relatórios de avaliação econômica em saúde; fornece um conjunto de itens essenciais que devem ser incluídos em estudos de avaliação econômica para garantir a clareza, consistência e comparabilidade dos resultados.
  • Nesta atualização de 2022, o guia discute a necessidade de envolver os pacientes e o público no desenvolvimento e aprimoramento dos conceitos e métodos utilizados nas avaliações econômicas em saúde.
  • Explora o conceito de engajamento de pacientes e público na avaliação econômica em saúde, reconhecendo a importância de diferentes perspectivas e experiências.
  • Descreve o processo de atualização do CHEERS, incluindo pesquisas e reuniões com especialistas em avaliação econômica e representantes do público, garantindo a inclusão de novas vozes.
  • Incorpora itens do checklist de estudos de avaliação econômica com base no feedback do público como, por exemplo, qual a abordagem utilizada no estudo para envolver pacientes e público na avaliação e qual o efeito do engajamento dos pacientes no estudo.

[1] É uma técnica baseada em fazer um painel com 5 a 10 especialistas a fim de obter informações e opiniões qualitativas o futuro de um determinado assunto. Sua funcionalidade é reduzir ao máximo as diferentes possibilidades de previsão ou suposições acerca do tópico selecionado.

Cristina (Tina) Guimarães
Políticas públicas e advocacy em saúde

Profissional com sólida formação acadêmica na área de Demografia da Saúde, experiência acadêmica e de pesquisa na área de saúde populacional com grupos de advocacy e quase 10 anos de experiência em trabalhos de pesquisa e consultoria em políticas de saúde no Brasil e no exterior, Tina Guimarães fundou sua própria consultoria em janeiro de 2020. Seu trabalho é centrado nos pilares de ampliação do conhecimento, por meio de cursos e treinamentos, e projetos de consultoria personalizados, centrados no trabalho em rede para a mudança política. 

Tina Guimarães é Bacharel em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Doutora em Demografia pelo Cedeplar/UFMG e Pós-Doutora pela Universidade de São Paulo. É também professora de Políticas de Saúde no MBA de Economia e Avaliação de Tecnologias de Saúde da FIPE. Dentre suas experiências anteriores como docente ainda estão: EAD em Políticas de Saúde no MBA de Pesquisa Clínica do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (PROADI-SUS); Professora no MBA de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (PROADI-SUS),no MBA de Gestão Atuarial da FIPECAFI e professora de Demografia no Curso de Ciências Atuariais da Universidade de São Paulo.

Cristina (Tina) Guimarães
Políticas públicas e advocacy em saúde

Profissional com sólida formação acadêmica na área de Demografia da Saúde, experiência acadêmica e de pesquisa na área de saúde populacional com grupos de advocacy e quase 10 anos de experiência em trabalhos de pesquisa e consultoria em políticas de saúde no Brasil e no exterior, Tina Guimarães fundou sua própria consultoria em janeiro de 2020. Seu trabalho é centrado nos pilares de ampliação do conhecimento, por meio de cursos e treinamentos, e projetos de consultoria personalizados, centrados no trabalho em rede para a mudança política. 

Tina Guimarães é Bacharel em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Doutora em Demografia pelo Cedeplar/UFMG e Pós-Doutora pela Universidade de São Paulo. É também professora de Políticas de Saúde no MBA de Economia e Avaliação de Tecnologias de Saúde da FIPE. Dentre suas experiências anteriores como docente ainda estão: EAD em Políticas de Saúde no MBA de Pesquisa Clínica do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (PROADI-SUS); Professora no MBA de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (PROADI-SUS),no MBA de Gestão Atuarial da FIPECAFI e professora de Demografia no Curso de Ciências Atuariais da Universidade de São Paulo.

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