QUINTA
CIENTÍFICA

DIA 03 Agosto

Avaliação do impacto da contribuição dos pacientes nas avaliações de tecnologias de saúde no NICE (National Institute for Health and Care Excellence)

Avaliação do impacto da contribuição dos pacientes nas avaliações de tecnologias de saúde no NICE (National Institute for Health and Care Excellence)

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Este texto é baseado na resenha do seguinte artigo: Livingstone H, Verdiel V, Crosbie H, Upadhyaya S, Harris K, Thomas L (2021). Evaluation of the impact of patient input in health technology assessments at NICE. International Journal of Technology Assessment in Health Care 37, e33, 1–13. https://doi.org/10.1017/S0266462320002214

Antecedentes e Objetivos

Os órgãos de avaliação de tecnologia em saúde (ATS) que incorporam relatos de experiências de pacientes em suas decisões (em geral denominados contribuição dos pacientes), são frequentemente questionados sobre o impacto dessas experiências nas deliberações do comitê e nas recomendações finais por parte de outras partes interessadas, como outros órgãos de ATS e grupos de defesa dos pacientes (Patient Advocacy Groups – PAGs). No entanto, o conceito de “impacto” pode ter significados diferentes para pessoas distintas; o que é impactante para uma agência de ATS pode ser percebido de forma distinta por uma associação de paciente. O impacto pode se manifestar tanto nas recomendações finais quanto no processo de tomada de decisão em si. A necessidade de exemplos do impacto da contribuição dos pacientes nos processos de ATS também foi um tema recorrente em um workshop sobre o apoio à entrada de grupos de pacientes com base em suas experiências em ATS na HTAi 2015 em Oslo.

Diante disso, o artigo em questão examina o impacto da contribuição dos pacientes nas orientações de procedimentos de intervenção[1] (Interventional Procedures – IPs) e tecnologias altamente especializadas (Highly Specialised Technologies – HSTs) no National Institute for Health and Care Excellence (NICE), o órgão de ATS do Reino Unido (nota Tina: como se fosse a Conitec no Brasil). A escolha desses dois programas se deu por suas diferentes competências e abordagens em relação à contribuição dos pacientes, bem como por seu interesse em avaliar tal contribuição e suas equipes de apoio relativamente pequenas em comparação com o programa geral de avaliação de tecnologias do NICE. Isso permitiu uma maior flexibilidade para o estudo. Ambos os programas seguem etapas semelhantes no desenvolvimento de orientações:

  • definição do escopo (definição da questão),
  • apresentação das evidências ao comitê e recomendações preliminares,
  • consulta pública,
  • resposta aos comentários recebidos e elaboração das recomendações finais pelo comitê,
  • período de revisão e publicação das recomendações.

O processo de ATS no NICE foi especialmente concebido para avaliar tratamentos para doenças raras na Inglaterra. Tais tratamentos geralmente têm uma população de pacientes muito reduzida, custos tecnológicos mais elevados e uma base de evidências limitada, o que resulta em incertezas. O comitê leva em consideração tanto a eficácia clínica quanto a relação custo-efetividade de cada tratamento. Oportunidades para a contribuição dos pacientes ocorrem na definição do escopo e na apresentação de evidências, bem como durante a discussão do comitê, consulta pública e solicitação de recursos. Para este estudo, a contribuição dos pacientes foi considerada na etapa de evidências, a qual se divide em três partes:

  • Submissão escrita de “evidências” pelas associações de pacientes;
  • Declarações por escrito de pacientes especialistas antes da reunião do comitê;
  • Participação de pacientes especialistas nas discussões do comitê.

A recomendação de procedimentos de intervenção envolve a avaliação de novos procedimentos que incluem a realização de cortes ou orifícios para acessar o interior do corpo do paciente, obtenção de acesso sem cortes ou uso de radiação eletromagnética. O comitê avalia a segurança e eficácia de tais procedimentos para uso no NHS (National Health Service). Para este estudo, a orientação de procedimentos de intervenção foi considerada uma ATS, embora se assemelhe mais a uma aprovação regulatória, pois não leva em conta a relação custo-efetividade. A contribuição dos pacientes para a recomendação de procedimentos de intervenção consiste no envio de evidências por parte de organizações de pacientes, experiências individuais de pacientes coletadas por meio de um processo chamado “comentários de pacientes” e respostas de organizações de pacientes e pacientes individuais às consultas. No entanto, a principal contribuição dos pacientes para a recomendação ocorre por meio dos “comentários de pacientes”, em que são realizadas pesquisas para coletar as experiências dos pacientes em relação a um novo procedimento, e essas pesquisas são apresentadas na fase de evidências. Os clínicos que realizam o procedimento ou as organizações de pacientes distribuem as pesquisas para os pacientes, que as preenchem e as enviam de volta ao NICE.

O objetivo do artigo foi determinar se a contribuição dos pacientes acrescenta impacto ao processo de ATS. O Grupo de Interesse em Envolvimento de Pacientes e Cidadãos da Avaliação Internacional de Tecnologia em Saúde (HTAi) estabeleceu valores e critérios internacionais para o envolvimento de pacientes na ATS; o quinto critério é “Fornecer feedback às PAGs que contribuíram para uma ATS, compartilhando quais contribuições foram mais úteis e fornecendo sugestões para auxiliar seu envolvimento futuro.”

O feedback tem o potencial de fornecer diversas ferramentas para ação: fornecer estudos de caso, exemplos de impacto e informações para produzir guias e ferramentas de apoio às partes interessadas dos pacientes. Ele também pode destacar o valor de incluir a contribuição de partes interessadas dos pacientes em agências de ATS, associações de pacientes e outras partes envolvidas no processo.

Para responder às questões acima, os autores do artigo criaram um processo no NICE para capturar e avaliar essas informações. Abaixo, seguem mais detalhes sobre a metodologia aplicada.

Métodos

Desenho do Estudo

O estudo foi conduzido entre janeiro de 2015 e novembro de 2019, adotando uma abordagem mista, semi-indutiva e exploratória. A pesquisa foi dividida em três fases distintas:

  • Fase um de ATS: Realizada em abril de 2017, essa fase consistiu em um estudo retrospectivo abrangendo quatro avaliações publicadas entre janeiro de 2015 e fevereiro de 2017.
  • Fase dois de ATS: Entre fevereiro de 2018 e novembro de 2019 foi feita uma coleta de dados durante o desenvolvimento de orientações para mais seis avaliações.
  • Recomendação de procedimentos intervencionais: Nesse período, de fevereiro de 2016 a outubro de 2018, foram coletados dados durante o desenvolvimento de vinte e seis procedimentos intervencionais.

O consentimento para participação no estudo foi obtido dos presidentes dos comitês e diretores associados em nome de seus comitês, uma vez que este estudo analisou dois fatores: a quantidade e o tipo de impacto por tópico para um processo de ATS. As informações foram agregadas em diferentes tópicos para avaliar o impacto por processo de ATS. Com base nos resultados, recomendações foram feitas para interromper a contribuição que não apresentasse impacto adicional e aprofundar a análise daquelas que tivessem impacto. Caso o estudo estabelecesse uma magnitude e tipo de impacto, essas informações poderiam ser utilizadas para diversos propósitos, incluindo feedback e orientação para grupos de defesa dos pacientes (PAGs) para seu engajamento futuro.

Desenvolvimento do Questionário

Para capturar dados quantitativos e qualitativos sobre a quantidade e o tipo de impacto da contribuição dos pacientes nas avaliações do NICE, foi desenvolvido um questionário breve de autopreenchimento. A escolha de um questionário de pesquisa se deu pela rapidez na coleta de dados, alta taxa de resposta, prontidão e conveniência (podendo ser preenchido imediatamente após as discussões do comitê) e uniformidade de respostas, permitindo um relato quantitativo do fenômeno.

Buscou-se consistência geral entre os questionários para ATS e procedimentos intervencionais para comparar os dados em ambos os programas, mas foi essencial adotar uma abordagem flexível para desenvolver questionários personalizados e adequados para cada processo de ATS. As questões foram inicialmente desenvolvidas pela equipe de PIP internamente, já que nenhuma pôde ser encontrada na literatura. Elas foram claras e precisas, com opções de resposta, permitindo também que os respondentes respondessem a perguntas abertas com texto livre. Os questionários foram validados por cada um dos dois programas e testados no programa de procedimentos intervencionais durante 6 meses.

Para avaliar o nível de impacto em ambos os programas, utilizou-se uma escala Likert de cinco pontos, variando de “nenhum impacto” a “impacto significativo”. Uma pergunta adicional de acompanhamento foi feita apenas quando um impacto foi identificado, buscando determinar o tipo de impacto. As opções para o tipo de impacto incluíram: corroboração de outras evidências, auxílio na interpretação de outras evidências ou fornecimento de novas evidências. Os entrevistados foram convidados a fornecer exemplos qualitativos para explicar suas respostas sobre o tipo de impacto.

Inicialmente, o questionário para as avaliações pretendia capturar o impacto da submissão de evidências pelas PAGs. Entretanto, como o comitê completava o questionário após discutir toda a evidência, as respostas abrangeram tanto a submissão das PAGs quanto as declarações escritas dos pacientes especialistas, seus depoimentos orais e as discussões durante a reunião. A Fase 1 incluiu uma pergunta sobre se a contribuição teve um impacto significativo nas recomendações do comitê, enquanto a Fase 2 substituiu essa pergunta por outra sobre se a contribuição ajudou a esclarecer os anos de vida ajustados pela qualidade (Quality-adjusted life-years – QALYs) e as razões de custo-efetividade incremental (Incremental cost-effectiveness ratios – ICERs).

Após o piloto de 6 meses para procedimentos intervencionais, o questionário foi revisado e modificado, principalmente em termos de apresentação e ordem das perguntas.

Participantes e Recrutamento

Foram buscadas respostas dos membros dos comitês de procedimentos intervencionais e ATS que estavam presentes durante as discussões de cada tópico de orientação que contou com a contribuição dos pacientes ao longo do período do estudo. Ambos os comitês são independentes do NICE e seus membros são recrutados de forma aberta. Cada comitê tem seu foco em um tipo diferente de ATS e possui tamanhos distintos, incluindo funcionários do NHS, acadêmicos, clínicos, representantes da indústria e membros leigos.

O questionário foi distribuído apenas para o comitê na fase de ATS do estudo, enquanto para os procedimentos intervencionais, tanto o comitê quanto a equipe técnica do NICE responsável pelos aspectos técnicos do processo de avaliação receberam os questionários.

Coleta de Dados

Para a fase um do estudo de ATS (retrospectivo), foi produzida uma versão online do questionário com uma versão opcional em Word. As respostas foram buscadas apenas dos membros do comitê presentes em cada discussão de ATS. Foram fornecidas cópias das submissões das PAGs e dos slides com as questões dos pacientes para refrescar suas memórias. Para a Fase 2, decidiu-se adotar o modelo de distribuição de questionários de procedimentos intervencionais.

Para procedimentos intervencionais, os questionários foram distribuídos ao final da discussão do comitê, em cópia impressa, em papel colorido (para se diferenciar de outros papéis). Eles foram preenchidos e coletados imediatamente após a conclusão da discussão do procedimento e antes do próximo item da agenda. Isso se mostrou eficiente em termos de taxa de resposta e qualidade das informações coletadas.

Análise de Dados

Após a coleta dos questionários, os dados foram inseridos em um sistema online. Inicialmente, a ferramenta escolhida foi o SurveyMonkey, mas devido a uma mudança na política corporativa, passamos a utilizar o Snap Surveys a partir de 10 de junho de 2019. Foram gerados relatórios e os dados foram exportados para um banco de dados do Microsoft Excel para análise estatística descritiva, principalmente calculando proporções e porcentagens para descrever a quantidade e o tipo de impacto da contribuição dos pacientes. As explicações fornecidas pelos entrevistados foram agrupadas de acordo com as respostas dadas para ilustrar suas escolhas, sem análises adicionais.

Uma vez que os dados foram analisados para a fase um de ATS e os primeiros 6 meses de avaliação de procedimentos intervencionais, o método de coleta de dados e o próprio questionário foram revisados.

Resultados

ATS – Fases 1 e 2

A parte relacionada à ATS do estudo incluiu dez recomendações e oitenta e sete respostas (vinte e uma respostas para os primeiros quatro tópicos de ATS e sessenta e seis respostas para as outras seis avaliações). Na primeira fase, a taxa média de resposta foi de 50% (desvio padrão ± 12%), enquanto na segunda fase foi de 94% (desvio padrão ± 4%). Nenhum dos entrevistados afirmou que a contribuição dos pacientes não teve impacto. Em ambos os estudos, as primeiras quatro avaliações obtiveram a maior pontuação tanto na quantidade de impacto quanto na apresentação de novas evidências.

Além dos dados quantitativos, o resumo das respostas para as duas fases do estudo de ATS gerou insights adicionais. Na primeira fase, a contribuição dos pacientes auxiliou em considerar fatores mais amplos, embora o comitê desejasse ter recebido dados mais sistemáticos dos pacientes. Na segunda fase, mais de um terço dos entrevistados afirmou que a contribuição dos pacientes ajudou a esclarecer os dados para a modelagem econômica em saúde (anos de vida ajustados pela qualidade – QALYs e razões de custo-efetividade incremental – ICERs), embora o comitê também desejasse ver mais informações sobre qualidade de vida, qualidade de vida dos cuidadores e uma variedade de diferentes experiências dos pacientes.

Procedimentos Intervencionais 

Foram avaliadas vinte e seis orientações de procedimentos intervencionais, incluindo os comentários dos pacientes, entre fevereiro de 2016 e outubro de 2018. Ao todo, 440 respostas foram coletadas para esses processos, com uma taxa média de resposta de 94%. Em média, houve dez comentários de pacientes por intervenção. Os dados coletados antes da alteração no questionário foram analisados separadamente quanto ao tipo de impacto, mas foram agrupados com os outros dados para a quantidade de impacto. No entanto, não havia opção para os entrevistados explicarem sua escolha para o nível de impacto na primeira versão dos questionários.

A maioria dos entrevistados (60%) relatou que a contribuição dos pacientes não teve impacto nas orientações. As cinco recomendações de procedimentos intervencionais para as quais a contribuição dos pacientes teve mais impacto (moderado ou significativo) foram:

  • Processo 780/2 (radioterapia para doença de Dupuytren precoce, 42%), 
  • Processo 1193 (cirurgia minimamente invasiva de fusão da articulação sacroilíaca para dor lombar crônica, 39%), 
  • Processo 660/2 (reparo cirúrgico de prolapso da parede vaginal usando tela, 36%), 
  • Processo 1012/2 (desfibrilador cardioversor implantável subcutâneo para prevenção de morte súbita cardíaca, 36%),
  • Processo 311/3 (sacrocolpopexia usando tela para reparar prolapso da cúpula vaginal, 32%). 

Os entrevistados puderam explicar suas escolhas apenas para dois desses processos quando a segunda versão do questionário foi utilizada. Para o processo 660/2, os entrevistados disseram que o comitê “dedicou muito tempo discutindo e fez mudanças significativas”, isso “levou a um comentário do comitê” e “apoiou o que [o entrevistado] já pensava”. Para o processo 1012/2, os entrevistados disseram que foi “útil devido ao impacto na vida do paciente”, “afirmou a coerência positiva com o dispositivo” e “confirmou a decisão do comitê”.

As cinco orientações de procedimentos intervencionais com a maior pontuação na quantidade de impacto também obtiveram a maior pontuação nas respostas sobre o tipo de impacto, sobre o apoio a outras evidências e nas respostas sobre inconsistência com outras evidências. Para quatro desses processos, os entrevistados disseram que os comentários recebidos foram positivos e ajudaram a confirmar as evidências, às vezes porque as evidências publicadas eram fracas. Para um desses cinco, o processo 660/2, os entrevistados indicaram que “os comentários dos pacientes destacaram complicações a longo prazo e resultaram em um comentário do comitê”.

Discussão

Principais Achados

Com base nos 536 questionários analisados nos programas de ATS e procedimentos intervencionais, os entrevistados concordaram que o tipo mais comum de impacto da contribuição dos pacientes foi o auxílio na interpretação de outras evidências, fornecendo contexto. Enquanto 30% dos entrevistados em procedimentos intervencionais disseram que a contribuição dos pacientes forneceu novas evidências, oferecendo perspectivas dos pacientes sobre o tratamento e as condições médicas, essa proporção foi reduzida para 17% nos processos de ATS deste estudo, embora tenha variado consideravelmente em cada avaliação. Membros do comitê de ambos os programas parecem valorizar não apenas a tranquilidade que a contribuição dos pacientes pode oferecer para a tomada de decisões (para as ATS, o segundo tipo de impacto mais popular foi o de corroborar com os outros dados), mas também apreciam a experiência dos pacientes, pois ela adiciona informações valiosas às outras disponíveis.

Na ATS, ninguém indicou que a contribuição dos pacientes não teve impacto nas orientações. No entanto, para os procedimentos intervencionais, a maioria dos entrevistados (35%) afirmou que não teve impacto. Os entrevistados justificaram essa escolha devido à incerteza em torno dos comentários dos pacientes (pequeno número de comentários, população de pacientes pouco clara, incerteza se o paciente foi submetido ao procedimento avaliado, intervenção realizada e dispositivo usado em pacientes sedados, falta de clareza na generalização dos dados) e disseram que os comentários acrescentavam informações mínimas. Ao analisarmos as recomendações que tiveram a maior pontuação na quantidade de impacto, a explicação mais comum para as ATS foi que ela trouxe novas evidências para o comitê sobre o impacto da condição e do tratamento na vida dos pacientes e cuidadores. Para os procedimentos intervencionais, as explicações estavam mais relacionadas à validação da decisão inicial do comitê.

Essas diferenças podem ser explicadas por três fatores: 

  • O diferente escopo dos dois programas, 
  • O nível e a quantidade de envolvimento dos pacientes
  • A quantidade de evidências publicadas. 

Em primeiro lugar, as ATS têm um escopo mais amplo, pois consideram a eficácia clínica e o custo, enquanto os procedimentos intervencionais consideram a segurança e eficácia. Em segundo lugar, o nível e a quantidade de envolvimento dos pacientes são maiores nas ATS, pois os pacientes participam do processo de definição do escopo, das reuniões do comitê e fornecem declarações por escrito. Para os procedimentos intervencionais, a contribuição dos pacientes é de nível inferior, principalmente como comentários dos pacientes. Por fim, geralmente há menos evidências publicadas disponíveis para as ATS do que para os procedimentos intervencionais, o que oferece novas informações do mundo real, explicando assim seu impacto moderado ou significativo. Para os procedimentos intervencionais, geralmente há mais evidências publicadas disponíveis, o que resulta em um impacto menos aparente na tomada de decisões (mudou a recomendação do IP para 7% dos entrevistados), mas ainda assim ajuda os tomadores de decisão ao fornecer informações sobre a qualidade de vida, muitas vezes ausentes em estudos publicados, e ao confirmar evidências de ensaios.

Comparação com a literatura existente

A literatura publicada sobre esse tema é escassa e geralmente indica a necessidade de evidências mais robustas do impacto. O impacto das contribuições por escrito de pacientes em avaliações de tecnologia em saúde já foi avaliado anteriormente no NICE, mas com um método diferente, por meio de entrevistas qualitativas com nove membros do comitê de avaliação do NICE. Até onde se sabe, este é o primeiro estudo a analisar tanto a quantidade quanto o tipo de impacto da contribuição dos pacientes nas orientações de ATS e procedimentos intervencionais. Além disso, é o único estudo em que os tomadores de decisão foram sistematicamente pesquisados ao mesmo tempo para todas as orientações com contribuição dos pacientes. Essa abordagem permitiu reunir uma grande quantidade de dados com uma alta taxa de resposta.

As conclusões estão alinhadas com descobertas anteriores: a contribuição dos pacientes ajuda a interpretar outras evidências, fornecendo contexto. Além disso, a partir desse estudo, quase um terço dos entrevistados afirmou que a contribuição dos pacientes forneceu novas evidências que ainda não foram apresentadas em outras publicações.

Limitações

Como em qualquer estudo acadêmico, esta pesquisa apresenta algumas limitações. No caso das ATS, primeiramente, foram conduzidos dois estudos distintos, um retrospectivo e outro contemporâneo ao comitê. Isso resultou em um número menor de entrevistados para o primeiro estudo, e os participantes tiveram que depender de suas memórias em vez de preencher o questionário imediatamente após as discussões.

Em segundo lugar, o objetivo original da pesquisa era medir o impacto da contribuição das organizações de pacientes (PAGs). No entanto, uma vez que o comitê também recebeu declarações individuais de pacientes especialistas e ouviu seus depoimentos e discussões durante as reuniões, tornou-se difícil avaliar os impactos dos três tipos de contribuição separadamente, pois eles foram considerados simultaneamente.

Terceiro, o comitê não participou do design e revisão do questionário. Além disso, o número de dez orientações de ATS não foi suficiente para mostrar tendências sobre o que foi mais útil, e as áreas de doenças foram diversas, exceto pela orientação sobre duas amiloidoses.

Além disso, o questionário foi alterado durante o estudo para refletir pequenas mudanças metodológicas no escopo do comitê, resultando em um subconjunto de dados que não pôde ser agrupado.

Para os procedimentos intervencionais, em primeiro lugar, o questionário mudou durante o estudo, resultando em dois conjuntos de dados que não puderam ser combinados para algumas perguntas. O formato de apresentação dos comentários dos pacientes também mudou durante o estudo, e isso pode ter influenciado as respostas dos entrevistados.

Em segundo lugar, os comentários dos pacientes nem sempre foram considerados juntos dentro de um tópico (às vezes os comentários foram recebidos tarde), então os entrevistados podem não ter se lembrado de todos os comentários dos pacientes ao responder ao questionário.

Em terceiro lugar, o número de comentários dos pacientes recebidos por IP variou de um a trinta e oito, e isso poderia ter influenciado o impacto. Em quarto lugar, embora tenham sido solicitadas explicações para as escolhas, a maioria dos entrevistados não as forneceu.

Em quinto lugar, a quantidade de evidências publicadas variou entre os procedimentos intervencionais. Por fim, não examinamos a influência das áreas de doenças dos procedimentos intervencionais estudados na contribuição dos pacientes.

Tanto para ATS quanto para os procedimentos intervencionais, a apresentação de opções de resposta para o tipo de impacto aos entrevistados pode ter restringido a variedade de impactos e as respostas qualitativas enviadas. No entanto, no questionário de ATS, havia uma opção de resposta “outro”, possibilitando que os entrevistados adicionassem ao tipo de impacto as opções fornecidas.

Próximos Passos

À medida que a contribuição dos pacientes torna-se cada vez mais crucial para a ATS, este estudo buscou mensurar o impacto do seu uso nos programas ATS e procedimentos intervencionais no NICE. Como resultado, o comitê demonstrou preferência para que a contribuição dos pacientes seja fundamentada por meio de pesquisas com os pacientes para avaliações. As respostas do questionário do comitê agora também são utilizadas para fornecer feedback às PAGs. No futuro, seria útil incluir a equipe técnica do NICE nos questionários para qualquer tipo de orientação, de modo que suas respostas também possam ajudar a informar as cartas de feedback. No caso dos procedimentos intervencionais, pedir aos membros do comitê que preencham um formulário ao final da reunião para cada procedimentos intervencional com comentários dos pacientes ampliou o foco do comitê na voz do paciente, o que se reflete na presença aumentada de comentários do comitê enfatizando a utilidade dos comentários dos pacientes para a orientação.

A participação do comitê no design dos questionários e o feedback regular fornecido sobre os resultados também aumentaram o engajamento do projeto pelo comitê, melhorando assim a taxa de resposta. Além disso, este estudo permitiu a coleta de estudos de caso do impacto da contribuição dos pacientes em procedimentos intervencionais. Para determinados tópicos (por exemplo, tela cirúrgica), também proporcionou uma visão mais equilibrada em comparação com os comentários dos pacientes recebidos durante a consulta.

No caso dos procedimentos intervencionais, o próximo passo poderia ser avaliar o impacto das contribuições das PAGs e, em última instância, comparar o impacto das pesquisas com os pacientes (comentários) e das contribuições das PAGs. Além disso, será importante aumentar a robustez dos dados das pesquisas com os pacientes, por exemplo, verificando se o paciente que respondeu a pesquisa realmente passou pelo procedimento em discussão. Por fim, seria útil verificar se um número mínimo de pesquisas com pacientes tem influência no nível de impacto.

A coleta adicional de dados de impacto é necessária para verificar se existem tendências de impacto em relação a tratamentos, dispositivos, procedimentos, áreas de doenças, métodos de contribuição dos pacientes, tipos de ATS ou se algumas combinações desses fatores são mais importantes ou eficazes. Isso implicaria na coleta sistemática de dados em ATS e na introdução da coleta de dados de impacto para outros tipos de ATS do NICE, como tecnologias médicas (MedTech), avaliações de tecnologias e diagnósticos. Um piloto já foi realizado para o MedTech em um tópico (gammaCore para cefaleia em cluster). Como incluiu uma pesquisa com pacientes, foi conduzido através do mesmo formato em papel, perguntando qual método de contribuição dos pacientes foi o mais útil, o quão útil foi e se forneceu novas informações. Todos os entrevistados afirmaram que a contribuição dos pacientes ajudou a determinar as recomendações. Os resultados estão destinados a futuras publicações.

Questionários mais comparáveis podem ser projetados para generalizar e comparar dados entre os programas. Os dados qualitativos também podem ser analisados. Se as tendências puderem ser identificadas e previstas, tanto os órgãos de ATS quanto as PAGs poderão ser direcionados a investir mais recursos nos aspectos da contribuição dos pacientes com maior impacto, e menos onde a contribuição tem menos influência. Uma análise adicional também poderia ser conduzida para ver se certos tipos de respondentes têm preferências por tipos específicos de contribuição dos pacientes. Além disso, deve-se considerar se perguntar uma questão aberta sobre o tipo de impacto pode verificar se os tipos propostos de impacto nos questionários são relevantes e talvez descobrir outro tipo de impacto.

Conclusão

Este estudo mostrou que o impacto da contribuição dos pacientes não é necessariamente explícito em mudar uma recomendação, mas fornece contexto, tranquilidade e novas informações ao comitê para o processo de tomada de decisão em ATS. Portanto, é importante que a coleta de dados de contribuição dos pacientes na ATS continue e se expanda. A análise do impacto da contribuição dos pacientes pelas equipes de envolvimento público e produção de orientações do NICE, juntamente com a participação do comitê, também deve continuar, a fim de monitorar e aumentar a qualidade dos dados de pacientes coletados. A contribuição dos pacientes deve evoluir de acordo com essas análises para melhor atender à tomada de decisões em ATS.

Por que indicados o artigo

  • Abordagem Inovadora: O artigo apresenta um estudo pioneiro e inovador sobre a contribuição dos pacientes em avaliações de tecnologia em saúde (ATS) e procedimentos intervencionais no NICE. É uma oportunidade de conhecer os impactos da voz dos pacientes na tomada de decisões.
  • Insights Reveladores: Além dos dados quantitativos das entrevistas aplicados, o estudo também proporciona insights por meio de análises qualitativas das respostas dos entrevistados. As conclusões revelam como a contribuição dos pacientes pode enriquecer a interpretação de evidências e fornecer novas perspectivas sobre tratamentos e condições médicas.
  • Relevância Atual: O artigo possui informações atualizadas sobre as tendências e práticas de contribuição dos pacientes no campo de ATS e procedimentos intervencionais. Isso é de extrema importância para entender como a participação ativa dos pacientes está moldando as decisões de saúde no presente.
  • Impacto nos Processos de Saúde: Ao mostrar como a contribuição dos pacientes influencia as orientações de saúde, o estudo demonstra como a inclusão ativa dos pacientes pode melhorar os processos de saúde, tornando-os mais centrados nas necessidades e perspectivas reais dos pacientes.
  • Recomendações Futuras: O estudo apresenta sugestões concretas para futuras pesquisas e aprimoramento das práticas de contribuição dos pacientes. Essas recomendações são cruciais para guiar políticas de saúde mais inclusivas e informadas.

[1] No contexto do NHS (National Health Service) do Reino Unido, “IPs” se refere a “Interventional Procedures” (Procedimentos Intervencionais). Esses procedimentos são atividades médicas que envolvem intervenções invasivas ou cirúrgicas realizadas para diagnóstico, tratamento ou prevenção de condições médicas específicas. Eles podem incluir uma variedade de técnicas médicas que requerem o uso de dispositivos ou instrumentos para acessar e tratar órgãos ou tecidos internos do corpo.

Cristina (Tina) Guimarães
Políticas públicas e advocacy em saúde

Profissional com sólida formação acadêmica na área de Demografia da Saúde, experiência acadêmica e de pesquisa na área de saúde populacional com grupos de advocacy e quase 10 anos de experiência em trabalhos de pesquisa e consultoria em políticas de saúde no Brasil e no exterior, Tina Guimarães fundou sua própria consultoria em janeiro de 2020. Seu trabalho é centrado nos pilares de ampliação do conhecimento, por meio de cursos e treinamentos, e projetos de consultoria personalizados, centrados no trabalho em rede para a mudança política. 

Tina Guimarães é Bacharel em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Doutora em Demografia pelo Cedeplar/UFMG e Pós-Doutora pela Universidade de São Paulo. É também professora de Políticas de Saúde no MBA de Economia e Avaliação de Tecnologias de Saúde da FIPE. Dentre suas experiências anteriores como docente ainda estão: EAD em Políticas de Saúde no MBA de Pesquisa Clínica do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (PROADI-SUS); Professora no MBA de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (PROADI-SUS),no MBA de Gestão Atuarial da FIPECAFI e professora de Demografia no Curso de Ciências Atuariais da Universidade de São Paulo.

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Profissional com sólida formação acadêmica na área de Demografia da Saúde, experiência acadêmica e de pesquisa na área de saúde populacional com grupos de advocacy e quase 10 anos de experiência em trabalhos de pesquisa e consultoria em políticas de saúde no Brasil e no exterior, Tina Guimarães fundou sua própria consultoria em janeiro de 2020. Seu trabalho é centrado nos pilares de ampliação do conhecimento, por meio de cursos e treinamentos, e projetos de consultoria personalizados, centrados no trabalho em rede para a mudança política. 

Tina Guimarães é Bacharel em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Doutora em Demografia pelo Cedeplar/UFMG e Pós-Doutora pela Universidade de São Paulo. É também professora de Políticas de Saúde no MBA de Economia e Avaliação de Tecnologias de Saúde da FIPE. Dentre suas experiências anteriores como docente ainda estão: EAD em Políticas de Saúde no MBA de Pesquisa Clínica do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (PROADI-SUS); Professora no MBA de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (PROADI-SUS),no MBA de Gestão Atuarial da FIPECAFI e professora de Demografia no Curso de Ciências Atuariais da Universidade de São Paulo.

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